Em solo goiano, ainda tinha gente com camisa do Brasil do dia anterior. Major está de camiseta preta
(Foto: Divulgação)
“Todos os anos são aplicados concursos para diversos cargos em vários estados. Dentre todos os sacrifícios do concurseiro, surge também a preocupação de como chegar ao local da prova. Há oito anos decidi fazer a Rios Excursões. Eu também sou concurseiro e sei de nosso sofrimento de ter que buscar hotel, viagem... É muito bom ver isso tudo planejado e só se preocupar em estudar”, diz Helder Rios, dono da empresa.
A Rios realiza uma média de 20 viagens por ano e tem mais de 3 mil concurseiros cadastrados no seu banco de dados. Na Bahia, poucas empresas são especializadas nesse ramo. Em Salvador, encontramos apenas mais uma, a Caravana do Marcão. “Na excursão você viaja apenas com concurseiro, troca conhecimento, faz amizades e, quem sabe amanhã, parceiro de trabalho”, completa Helder.
De fato, viajar numa excursão assim é como construir uma família. Com 30 minutos de viagem, todos já sonhavam trabalhar juntos no Centro-Oeste. Trocavam informações, ensinavam assuntos, tiravam dúvidas. A viagem, mesmo com o Brasil eliminado na Copa, se tornou uma aventura agradável com um grupo unido.
Toda esta integração chamou a atenção de Wesley Silva, de 23 anos, aquele mesmo que estava segurando o celular no jogo do Brasil. Foi a primeira viagem dele de excursão. “Cara, ganhei uma família nesta viagem, com os mesmos problemas e sonhos”, disse. Wesley estuda desde 2020, quando se formou em tecnólogo em gestão pública. O pai sempre o incentivou a estudar e não deixou o filho trabalhar, pedindo para que ele estudasse. Isso custou caro para Wesley, principalmente com alguns familiares.
“Meu pai é peão, trabalha duro. Doía muito ter que ver meu pai indo trabalhar à noite, enquanto eu estava me dedicando aos estudos. Muitos familiares diziam que eu estava me aproveitando da bondade do meu pai para ficar na zona de conforto. Diziam que meu pai era meu escravo, que eu era principezinho dele. Me machucava muito ouvir isso. Acho que o concurseiro sofre muito preconceito quanto a isso, pois ninguém enxerga como um investimento a médio e longo prazo”, lembra Wesley.
Ele, como quase todo concurseiro, levou muito pau. Tomou bomba na PM baiana, prefeitura de Salvador, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Civil de Alagoas, de São Paulo… Mas nada de desistir. Este ano, passou para a Polícia Penal de Pernambuco e a Civil da Bahia. “Concurseiro sofre, pega estrada, roda o Brasil, mas não desiste nunca. A fila anda, e uma hora chega nossa vez. Quando chega, é bom demais. Meu pai está radiante e eu também. Construímos juntos este sonho. E não parei, viu? Meu foco é a PRF”, diz Wesley.
A primeira parada em território goiano foi no meio da estrada. O relógio já apontava quase 22h quando finalmente foi possível tomar um banho. Custava RS 10, oito minutos de chuveirada. Um frentista controlava o registro. “Tá quase acabando o chuveiro número 5! Adiante aí!”, gritava o fiscal de banho.
No restaurante, mais um golpe. Ao invés do tradicional cafezinho (R$ 6), optei por um suco de laranja que custava R$ 10. Acreditava ser uma jarra, mas era um copo de 300 ml com quatro pedras de gelo dentro. “O Correios foi furtado mediante fraude! Vamo prender todo mundo aqui”, gritava Major, enquanto segurava sua necessaire escrito “pai do ano” como se fosse arma.
Após 31 horas, finalmente a excursão chegou a Goiânia, no sábado, às 14h. Almoço PF de R$ 21 e hotel até com banheira. O baiano Negro Jay não contou conversa. Foi encher a banheira para relaxar enquanto assistia a um resumão. Mas concurseiro só se lasca: na primeira rodada do registro da água fria, a torneira quebrou. “Porra, tive que tomar banho só com o chuveiro quente. Quente, não, fervendo. Não sei se me banhei ou ganhei algumas queimaduras de segundo grau”, brincou. Em Goiânia, todos se entocaram nos quartos para dar uma revisada final. À noite, um passeio rápido pela cidade. Alguns empolgados prorrogaram, só chegando 2h da manhã no hotel. Ninguém é de ferro.
A prova foi na tarde de domingo. Todos já deveriam estar de banho tomado e com as malas no ônibus, pois logo após a prova pegaríamos estrada novamente. Após cinco horas de prova, a própria Rios Excursões liberou um tempinho para a turma passear um pouco por Goiânia e jantar. Todos foram para a Feira do Sol, um evento local com comidas típicas. Após a prova com 80 questões e uma redação, este foi um dos raros momentos de relaxamento. “Acho que o pós-prova é o momento de paz para o concurseiro, pelo menos até o dia seguinte, quando já nos preparamos para o próximo edital”, comentou Leandro Aquino.